Archive for 23 Março, 2005
CARTA DE PÊRO VAZ DE CAMINHA (XIII)
“Trouxemo-la dali com esses religiosos e sacerdotes diante, cantando, maneira de procissão. Eram já aí alguns deles, obra de setenta ou oitenta; e, quando nos assim viram vir, alguns deles se foram meter debaixo dela a ajudar-nos.
Passámos o rio ao longo da praia e fo-mo-la pôr onde havia de ser, que será do rio obra de dous tiros de besta. Ali andando nisto, viriam bem cento cinquenta ou mais. Chantada a cruz com as armas e divisa de Vossa Alteza, que lhe primeiro pregaram, armaram altar ao pé dela. Ali disse missa o padre frei Henrique, a qual foi cantada e oficiada por esses já ditos.
Ali estiveram connosco a ela obra de cinquenta ou sessenta deles, assentados todos em joelhos, assim como nós. E, quando veio ao Evangelho, que nos erguemos todos em pé, com as mãos levantadas, eles se levantaram connosco e alçaram as mãos, estando assim até ser acabado. E então tornaram-se a assentar como nós. E, quando levantaram a Deus, que nos pusemos em joelhos, eles se puseram todos assim como nós estávamos, com as mãos levantadas e em tal maneira assossegados, que certifico a Vossa Alteza que nos fez muita devoção.
Estiveram assim connosco até acabada a comunhão. E, depois da comunhão, comungaram esses religiosos e sacerdotes e o capitão com alguns de nós outros. Alguns deles, por o sol ser grande, em nós estando comungando, alevantaram-se, e outros estiveram e ficaram. Um deles, homem de cinquenta ou cinquenta e cinco anos, ficou ali com aqueles que ficaram.
Aquele, em nós assim estando, ajuntava aqueles que ali ficaram e ainda chamava outros. Este, andando assim entre eles, falando-lhes, acenou com o dedo para o altar e depois mostrou o dedo para o céu, como que lhes dizia alguma cousa de bem; e nós assim o tomámos. Acabada a missa, tirou o padre a vestimenta de cima e ficou na alva. E assim se subiu, junto com o altar, em uma cadeira e ali nos pregou do Evangelho e dos Apóstolos, cujo dia hoje é, tratando, em fim, da pregação deste vosso prosseguimento tão santo e virtuoso, que nos causou mais devoção.
Esses, que à pregação sempre estiveram, estavam, assim como nós, olhando para ele. E aquele, que digo, chamava alguns, que viessem para ali. Alguns vinham e outros iam-se. E, acabada a pregação, trazia Nicolau Coelho muitas cruzes de estanho com crucifixos, que lhe ficaram ainda da outra vinda. E houveram por bem que lançassem a cada um sua ao pescoço, pela qual cousa se assentou o padre frei Henrique ao pé da cruz e ali, a um e um lançava sua, atada em um fio ao pescoço, fazendo-lha beijar e alevantar as mãos.
Vinham a isso muitos e lançaram-nas todas, que seriam obra de quarenta ou cinquenta. E isto acabado, era já bem uma hora depois do meio dia, viemos às naus comer, onde o capitão trouxe consigo aquele mesmo que fez aos outros aquela mostrança para o altar e para o céu e um seu irmão com ele, ao qual fez muita honra, e deu-lhe uma camisa mourisca e ao outro uma camisa destoutras.”
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LÍNGUAS MINORITÁRIAS NA EUROPA (XVIII)
A língua basca (em basco Euskera) é a mais antiga falada na Europa, sendo um dos raros idiomas que não provêm do ramo indo-europeu.
O Basco compreende vários dialectos, sendo a região que fala o basco partilhada entre a Espanha (na Comunidade Autonómica Vasca – constituída pelas províncias de Araba, Vizcaya e Gipuzkoa, com uma população de cerca de 2 milhões de habitantes – e na região de Navarra) e o país basco francês (Departamento dos Pirinéus Atlânticos), sendo a língua falada por cerca de 80 000 pessoas em França e cerca de 600 000 pessoas em Espanha, onde a percentagem de jovens falantes tem vindo a aumentar graças às políticas linguísticas seguidas pelo governo autonómico (ou seja, um total de cerca de 25 % da população das regiões abrangidas pela língua).
Nos termos da Constituição espanhola de 1978 e do Estatuto da Comunidade Basca de 1979, o Basco é língua oficial da Comunidade, a par do Castelhano, língua oficial de Espanha. A lei de normalização do Euskera estatui que todos os cidadãos têm direito de aprender e utilizar ambas as línguas em qualquer situação.
O aspecto mais significativo do actual estatuto social da língua é a forma como o seu conhecimento tem crescido nas vertentes demográfica, geográfica e funcional. O crescimento do uso da língua é particularmente notório no segmento entre os 5 e os 14 anos, que cresceu aprendendo a língua na escola.
Em anos recentes, numerosas associações em França lançaram também iniciativas de promoção do basco – nomeadamente escolas bascas, cursos de basco para adultos, criação da Real Academia de Língua Basca (Euskalzaindia) e rádio basca – algumas delas mesmo com apoio da União Europeia.
A língua basca tem o estatuto de língua regional em França, o que é considerado como uma manifestação da rica diversidade cultural do país, sem que tal signifique contudo a adopção de significativas medidas de promoção da língua.
Na parte francesa, são publicados alguns jornais inteiramente escritos em basco, mas com tiragens reduzidas (menos de 10 000 exemplares).
Artigos 1, 3, 4 e 5 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, em Basco:
“1. atala
Gizon-emakume guziak aske sortzen dira, duintasun eta eskubide berberak dituztela; eta ezaguera eta kontzientzia dutenez gero, elkarren artean senide bezala jokatu behar dute.
3. atala
Norbanako guziek dute bizitzeko, aske izateko eta segurtasunerako eskubidea.
4. atala
Inor ez da izango besteren esklabu edo uztarpeko; debekatua dago esklabutza eta esklabuen salerosketa oro.
5. atala
Ezin daiteke inor torturatu, ezta inori zigor edo tratu txar, anker eta lotsarazlerik eman ere.”
[2160]