"OS LUSÍADAS" (IV)
O Canto IV prossegue com a história de Portugal narrada por Vasco da Gama, desde a ascensão do Mestre de Aviz, batalha de Aljubarrota, as conquistas de África na época de D. João II, até ao reinado de D. Manuel, culminando com o episódio do “Velho do Restelo”, advertindo de forma pessimista os portugueses sobre os perigos decorrentes da vaidade e da ambição de fama, no momento da partida da armada para a Índia.
“«Despois de procelosa tempestade,
Nocturna sombra e sibilante vento,
Traz a manhã serena claridade,
Esperança de porto e salvamento;
Aparta o Sol a negra escuridade,
Removendo o temor ao pensamento:
Assi no Reino forte aconteceu
Despois que o Rei Fernando faleceu.
«Porque, se muito os nossos desejaram
Quem os danos e ofensas vá vingando
Naqueles que tão bem se aproveitaram
Do descuido remisso de Fernando,
Despois de pouco tempo o alcançaram,
Joane, sempre ilustre, alevantando
Por Rei, como de Pedro único herdeiro
(Ainda que bastardo) verdadeiro.
«Ser isto ordenação dos Céus divina
Por sinais muito claros se mostrou,
Quando em Évora a voz de ũa minina,
Ante tempo falando, o nomeou.
E, como cousa, enfim, que o Céu destina,
No berço o corpo e a voz alevantou:
– «Portugal, Portugal (alçando a mão,
Disse) polo Rei novo, Dom João!»
«Alteradas então do Reino as gentes
Co ódio que ocupado os peitos tinha,
Absolutas cruezas e evidentes
Faz do povo o furor, por onde vinha;
Matando vão amigos e parentes
Do adúltero Conde e da Rainha,
Com quem sua incontinência desonesta
Mais (despois de viúva) manifesta.”
[1839]