Archive for 2 Maio, 2005
À CONVERSA COM PAUL AUSTER (VII)
Diversamente de todos os seus restantes livros, que têm como personagens pessoas, em Timbuktu escreve sobre um cão (ainda assim, de alguma forma “personificado”, como “Mr. Bones”).
Em resposta, Auster revela a génese desse livro como resultado do início da escrita do que seria outra obra; no final do primeiro capítulo, gostou de tal forma de “Mr. Bones” que decidiu escrever um livro diferente, contando a sua história.
A questão com mais conteúdo “político” da noite seria a de que diferenças vê entre Nova Iorque e a América.
Depois de uma breve referência a Bush, Auster pegaria no tema pela vertente de que cerca de 40 % dos habitantes de Nova Iorque são imigrantes, com culturas variadas e falando uma grande diversidade de línguas. Considera notável que nela confluam e coabitem / convivam de forma harmoniosa, sem grandes problemas sociais, cerca de 8 milhões de pessoas (quase tantas como em Portugal!…), de diferentes raças e grupos étnicos, culturas e religiões.
À pergunta sobre se os livros que escreve funcionam como “auto-análise”, responderia que não; são natural e necessariamente um produto / um resultado do que é como pessoa, das suas experiências e vivências, sem contudo serem auto-biográficos, nem constituindo nenhum género de “terapia”.
A noite aproximava-se do fim quando foi questionado se “vivia para trabalhar ou se trabalhava para viver”.
Retomaria uma velha ideia de que os americanos viveriam para trabalhar, enquanto que os europeus trabalhariam para viver, na qual diz não se rever. Em síntese, a escrita é (uma) parte (fundamental) da sua vida.
E, à questão final, sobre que diferenças encontrava entre a poesia e a prosa, reafirmando que não tem experiência de escrita poética, disse entender os poemas mais como fotografias, enquanto que os romances (“com a sua multiplicidade de vozes a falar em simultâneo”) seriam mais como filmes!…
P. S. Pedro Mexia escreve hoje, na sua coluna no Diário de Notícias, sobre “a conversa” com Paul Auster: “Auster, estrela intelectual“.
O Correio da Manhã também reporta a “conferência” de Paul Auster.
P. P. S. – A ler também a entrevista de Paul Auster a “O Comércio do Porto“.
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À CONVERSA COM PAUL AUSTER (VI)
Auster agradece e responde com uma interrogação: “Porque continuamos a ler livros?”
E dá ele próprio a resposta: “A razão é porque um livro é a única “circunstância” em que “dois estranhos” (autor e leitor) se podem “encontrar” de uma forma completa, sem reservas”.
Cada leitor lê “um livro diferente”; trata-se de uma experiência muito pessoal; o escritor e o leitor “fazem” o livro em conjunto!
Questionado sobre como se sente a nível de poesia, responde que não escreve poesia há mais de 25 anos; “Só para a família!…”.
Seguiu-se então a pergunta sobre a sensação de estar prestes a finalizar um livro, ao que responderia que, ao escrever, está tão envolvido que não tem oportunidade de pensar: “Estou a acabar…”. E acrescenta que, eventualmente a par do “alívio” de concluir a obra, subsiste sempre uma sensação de algum “falhanço”, assim como a tristeza de dizer adeus a “pessoas” com quem, por vezes, “(con)viveu” anos!
Pegando no mote, foi-lhe então perguntado se não passa por situações de bloqueio, ao que confirmou que são frequentes os bloqueios e paragens (que podem ser prolongadas); mas que, quase sempre, acaba por haver uma retoma.
São momentos difíceis mas, com a experiência, vai-se aprendendo a ser mais paciente: “Hei-de conseguir encontrar uma saída para continuar a história…”.
Refere ainda que, no período de escrita, se isola, “corta com tudo”, nem vê o que o rodeia: “É por isso que não tenho quadros nas paredes!… Estou concentrado no que estou a escrever e não a olhar para as paredes…”.
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À CONVERSA COM PAUL AUSTER (V)
Seguir-se-ia o momento mais divertido da noite, quando foi questionado sobre “onde se podem comprar em Portugal os agora célebres cadernos portugueses?”.
A resposta foi: “Se souberem, digam-me!…”.
Voltando a “A Noite do Oráculo”, e ao momento em que a personagem (Nick) se encerra – sem levar consigo as chaves… – num quarto que é uma espécie de abrigo antinuclear, com uma porta que se fecha automaticamente, sem possibilidade de fuga, é colocada a questão se Auster pretenderá escrever um novo livro, retomando a história nesse ponto.
Auster responde, de forma inequívoca, que não. E, novamente divertido, adianta que Nick ficará lá “preso para sempre”; não conseguirá sair de lá… “É um problema do Sidney (personagem do livro que escrevia, paralelamente, a história de Nick) e não meu!”. “Vamos lá deixá-lo sozinho”. “Eu seria capaz de dar uma continuação ao beco sem saída em que a história se transformou, mas o Sidney não tem essa capacidade”, concluiu com humor.
A propósito de uma personagem que lê Fernando Pessoa, é-lhe perguntado se leu Pessoa.
O escritor parece “acusar o toque” e responde que é claro que leu Pessoa, e já há muito tempo; senão, não o teria referido no livro… Conclui mesmo dizendo que o considera um dos mais estimulantes poetas que conhece.
A pergunta seguinte teve como “preâmbulo” um agradecimento, na medida em que, sendo a leitura (tal como a escrita…) um acto de solidão, os seus livros proporcionam maravilhosos momentos a quem tem o privilégio de os ler.
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