“BLOGOSFERA” EM 2004 (XXIII)
A 6 de Outubro, dá-se o “Caso Marcelo“, com a suspensão dos comentários de Marcelo Rebelo de Sousa na TVI, devido a alegadas pressões sofridas, também na sequência de críticas do Ministro dos Assuntos Parlamentares ao formato da sua intervenção televisiva, “sem contraditório”.
A blogosfera – como sempre – reagiu de imediato (conforme destacado em artigo de Cristina Bernardo Silva no “Expresso” online – ver em “entrada estendida”):
– Causa Nossa – “Factos: a) Um Ministro condena duramente o comentário político dominical de MRS na TVI; b) O visado reserva-se o direito de responder no próximo programa; c) Depois de uma conversa com o proprietário da estação, por inicitiva deste, MSR anuncia a imediata cessação do seu programa; d) MRS não dá explicações para esta súbita decisão, dizendo somente que durante mais de quatro anos sempre pôde conceber e executar “livremente” o seu programa, deixando entender que essa liberdade teria deixado de existir. As perguntas são óbvias: (i) O que é que Paes do Amaral disse a MRS, para forçar este a abandonar o programa, que claramente fazia com inexcedível gozo? (ii) O que é que levou Paes do Amaral a provocar o fim de um programa que evidentemente trazia enormes vantagens à estação? (iii) O que é que o Governo teve a ver com isso?”
– Tugir – “Deduz-se, do nevoeiro ainda envolto nesta rescisão de serviços, que há dedo do Governo e que um canal de televisão cedeu ao poder político.”
– Bloguitica (“entrada” nº 1988, a 06.10.04) – “Em poucas linhas, Marcelo Rebelo de Sousa sai da TVI fazendo estragos demolidores. Em primeiro lugar, o comentador dominical da TVI deixa bem claro que Paes do Amaral vergou perante as pressões de Pedro Santana Lopes. O presidente da Media Capital solicitou uma conversa com Marcelo Rebelo de Sousa que não foi certamente para discutir fait-divers. Em segundo lugar, Marcelo Rebelo de Sousa deixa bem claro que sempre comentou livremente na TVI. Infere-se das suas palavras que agora não o poderá continuar a fazer, precisamente devido à interferência de Paes do Amaral e de… Santana Lopes!”
– Barnabé – “O que se passou hoje – o afastamento de Marcelo da TVI – foi o caso mais grave de censura em Portugal desde os tempos revolucionários. […] Um ministro atacou agressivamente um comentador e exigiu que a Alta-autoridade agisse sobre esse comentador. O patrão da Media Capital chamou esse comentador para uma conversa. Esse comentador demitiu-se e já nem sequer faz o seu próximo comentário, onde em princípio responderia ao ataque do ministro.”
– Blogue de Esquerda – “Respondendo às perguntas dos jornalistas, há pouco mais de 10 minutos, Santana Lopes não evitou os mais eloquentes sinais de embaraço, quando confrontado com o affaire Marcelo. Ou seja, o que começou por ser um simples tiro no pé, ameaça transformar-se agora numa ameaçadora gangrena política, de consequências imprevisíveis. Pior: em vez de encarar com frontalidade o problema, esclarecendo o que fosse passível de explicação (se é que existe explicação para um cada vez mais evidente caso de pressão política censória), o primeiro-ministro limitou-se, na sua conferência de imprensa, a ensaiar desajeitadíssimas manobras de fuga à responsabilidade que lhe cabe, inteira, nesta barafunda.”
– Abrupto (“Rigorosos e especiosos” – 07.10.04) – “Em qualquer democracia o que ele fez são pressões. São pressões para Marcelo, são pressões para a Media Capital, são pressões para a AACS, são pressões para toda a gente…”
– Blasfémias – “Ver ou não ver, gostar ou não gostar dos comentários de Marcelo Rebelo de Sousa é completamente indiferente. O Governo PSD/PP utilizou a pressão política e económica para silenciar alguém que é incómodo ao poder. É grave e muito preocupante.”
– Mar Salgado – “O jogo mudou. Marcelo beneficia de efeitos conhecidos de há meio-século em Psicologia Social no campo da mudança de atitudes: o da “credibilidade da fonte ” e o da “confiança da fonte”. […] Se a isto acrescentarmos o poder da simplificação da mensagem televisiva e a ausência de anti-corpos críticos na massa de indivíduos que julgavam receber um banho de cultura semanal do Prof. Marcelo, compreende-se o pânico do Governo. É humano.”
“Marcelo na blogosfera
Tal como nos jornais, nas rádios e nas televisões, a saída de Marcelo Rebelo de Sousa da TVI tem sido amplamente debatida na blogosfera nacional, em especial através dos blogues mais atentos às áreas da política e/ou da comunicação social.
A maioria dos artigos publicados nos últimos dias tem incidido, por um lado, nas alegadas pressões exercidas pelo Governo ou por grupos económicos no sentido condicionar os comentários dominicais do professor e nas implicações daí decorrentes para a limitação da liberdade de expressão; e, por outro lado, na possibilidade de tudo não passar de uma «jogada» de Marcelo Rebelo de Sousa, com vista a uma candidatura a Belém.
Na opinião do escritor e jornalista Francisco José Viegas, autor do blogue «Aviz», «é evidente que está em causa a liberdade de expressão, ao contrário do que escreveram (nos jornais) e disseram (na rádio) hoje [8 de Novembro] os especialistas em ‘politiquinha’ e que justificam tudo com a hipótese de se tratar de mais uma traquinice do Marcelo».
«Estou-me bem nas tintas para saber se MRS [Marcelo Rebelo de Sousa] quer ser candidato a Presidente da República ou a provedor da Santa Casa. E não acho significativo que MRS escolha o silêncio para castigar ou penalizar o Governo. Isso interessa os especialistas em ‘politiquinha’- e até pode interessar o próprio Marcelo. Agora, o que eu acho significativo é que todas as coisas que se passaram estavam já inscritas nas palavras do ministro [dos Assuntos Parlamentares, Rui Gomes da Silva]», acrescenta Francisco José Viegas.
O governante afirmou na semana passada sentir-se «revoltado com as mentiras e falsidades» proferidas todos os domingos «por um comentador que tem um problema com o primeiro-ministro», Pedro Santana Lopes.
No «Abrupto», José Pacheco Pereira escreve que alguns blogues «querem-nos convencer que não se pode falar de pressões do Governo sobre a TVI , sem a implausível comprovação pela TVI ou pelo Governo. Bem podem esperar sentados. Nós, os comuns mortais, não precisamos de mais nada: ‘precipitamo-nos a tirar conclusões’, ‘com má fé’, porque quando um ministro próximo do primeiro-ministro (…) diz o que disse, não é preciso mais nada».
E acrescenta: «Em qualquer democracia, o que ele fez são pressões. São pressões para Marcelo, são pressões para a Media Capital, são pressões para a AACS [Alta Autoridade para a Comunicação Social], são pressões para toda a gente, menos para os especiosos.» Pacheco Pereira alerta ainda para o facto de Rui Gomes da Silva fazer «parte dos que mandam».
«Não são só palavras, têm por trás a possibilidade de dar e de negar, de aprovar ou recusar, de fazer ou de desfazer, de empregar ou desempregar. É por isso que são pressões e não são inócuas», conclui.
O jurista Vital Moreira, através do blogue «Causa Nossa», salienta que é preciso distinguir «pluralismo de opiniões, favorecido pelo contraditório, não necessariamente simultâneo, mas pelo menos com audiência equivalente» da «pressão pública e/ou privada sobre um meio de comunicação social e/ou sobre um comentador ou jornalista para que modere ou altere as suas opiniões». O constitucionalista lamenta que «a primeira destas questões não tivesse sido discutida mais cedo e de outro modo».
Vital Moreira deixa ainda no ar algumas questões, tais como: «Por que é que Marcelo R. de Sousa continua sem esclarecer pessoal e publicamente as razões da sua saída da TVI?» e, «se houve menção pública de pressões de ‘accionistas da TVI’, por que é que se insiste em referir somente as prováveis (embora desmentidas) pressões do Governo sobre a estação de televisão, ilibando as invocadas (e não desmentidas) pressões do próprio grupo económico proprietário da estação?».
No blogue «Barnabé», Daniel Oliveira analisa com ironia a corrida a Belém no PSD, escrevendo: «Com Marcelo em guerra e Cavaco ao lado dele, Santana Lopes não tem nenhum candidato à presidência que não lhe queira a pele. Santana, que antes queria afastar os dois, consegue-o finalmente, mas quando ele próprio já está fora da corrida. E pensar que eles eram tantos. Agora, nem um.»
No «Bloguítica», Paulo Gorjão refere que ficou «claramente demonstrado que o rei vai nu e que o primeiro-ministro é um democrata com pés de barro». Ou seja, acrescenta, ficou «claramente demonstrado que Santana Lopes utiliza a comunicação social, mas não tolera que os seus adversários o façam. Um democrata ‘à la carte’».”
(texto de Cristina Bernardo Silva no “Expresso” online)
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