Vitórias e derrotas

28 Setembro, 2009 at 9:15 am Deixe um comentário

Os resultados de eleições são inevitavelmente sujeitos a leituras sob uma pluridade de perspectivas de análise ou de observação, mais ou menos objectivas ou subjectivas, dependendo nomeadamente do grau de envolvimento ou reconhecimento face a cada uma das forças em compita.

No caso das eleições de ontem, temos – como vem sendo hábito – diversos partidos a reclamar vitória… quando, efectivamente, quase todos registam algum grau de derrota.

De uma coisa não subsistirão dúvidas: o Partido Socialista venceu as eleições; teve mais votos e mais deputados que os restantes concorrentes; assumirá a responsabilidade de formar Governo. Numa conjuntura particularmente adversa e desfavorável, desde logo a nível internacional e de envolvente macro-económica, mas também por todas as restantes questões e polémicas que enfrentou, o PS consegue revalidar a vitória.

Não obstante, perdeu – face a 2005 – mais de meio milhão de votos, correspondendo a cerca de 8,5 pontos percentuais, e, excluindo os resultados da emigração, dispondo de menos 24 deputados, o que lhe retira a maioria absoluta, colocando-o na dependência de outras forças políticas para levar a cabo a governação.

Uma vitória que, não sendo extraordinária (contrariamente ao reclamado por José Sócrates), requer que seja devidamente compreendida a mensagem transmitida pelos portugueses: confiança no Governo, mas com uma postura necessariamente diversa da adoptada em algumas das fases da legislatura anterior.

Extraordinária foi sim a derrota do PSD – o único dos principais partidos a não ter qualquer atenuante perante a dimensão dos resultados. Culminando uma paupérrima campanha, sem ideias, sem propostas, sem uma linha de rumo estratégico definida, pautada pela negativismo e pelo pessimismo, o PSD não teve a capacidade de compreender a vitória nas eleições europeias, porque vencera e como vencera, deixando-se induzir num crucial erro, o de que bastaria limitar-se a esperar a derrota adversária, acabando por ser natural e severamente penalizado pelo eleitorado.

Mantendo praticamente a votação de 2005, consegue melhorar 0,3 % a sua percentagem; fica todavia muito aquém do PS, a mais de 400 000 votos. Recupera apenas 6 deputados, do total de 24 perdidos pelo rival.

O CDS é o outro principal vencedor deste acto eleitoral: com o melhor resultado dos últimos 26 anos, cresce perto de 180 000 votos, subindo de 7,2 % para cerca de 10,5 %, ampliando a sua representação parlamentar de 12 para 21 deputados.

Acima de tudo, passa a poder constituir-se em força de charneira no Parlamento; nas situações em que o PS não disponha do apoio da esquerda, competirá ao CDS decidir se contribui ou não para a obtenção de uma maioria parlamentar, que permita viabilizar algumas das medidas do Governo (nomeadamente o Orçamento…).

Conforme referiu na noite de ontem um eufórico Paulo Portas, o CDS alcançou todos os cinco objectivos que dependiam de si; falhou apenas um, o de chegar ao Governo, expectativa que mantinha, caso o PSD não tivesse registado um descalabro tão grande. A grande questão para o CDS será: o que fazer com esta representação parlamentar? Paulo Portas deu o mote: o CDS continuará a ser a principal força de oposição ao Governo.

O Bloco de Esquerda tem uma tão extraordinária… como inesperadamente agridoce vitória. Duplica o seu número de deputados, passando de 8 a 16, resultado de um crescimento de mais de 190 000 votos, reforçando a sua percentagem de votação, de 6,35 % para 9,85 %.

Todavia, fica aquém do que algumas sondagens pareciam antecipar; não consegue atingir o objectivo de ser a terceira força política… e, sobretudo, não garantindo ao PS a maioria absoluta parlamentar, vê decisivamente limitada a sua acção de condicionamento das políticas governativas. Tal como em relação ao CDS, adquire crecente acuidade a questão: o que fazer com estes votos, numa altura em que, paradoxalmente, o Bloco poderá porventura ter atingido a sua expressão eleitoral máxima, dado o contexto especial em que decorreram estas eleições.

Jerónimo de Sousa procurava ontem disfarçar o sentimento de desilusão, reclamando para a CDU um crescimento sustentado (sob um slogan dos apoiantes que, mais do que nunca, pareceu inadaptado à realidade: «Com toda a confiança, a CDU avança»).

É bem verdade que a coligação PCP-PEV cresce cerca de 13 000 votos, passando de 7,5 % a 7,9 %, ao mesmo tempo que ganha um deputado (de 14 para 15). Não obstante, é ultrapassado por todas as forças políticas com representação parlamentar, passando a uma inédita quinta posição, o que não deixa de constituir um enfranquecimento do seu enquadramento institucional. Tendo dado o seu pequeno contributo para retirar a maioria absoluta ao PS, os seus deputados só serão decisivos para apoiar o Governo desde que em articulação com o Bloco de Esquerda; para o contrariar, necessitarão ainda da colaboração do CDS-PP…

Os “pequenos partidos” – uma vez mais algo maltratados pela comunicação social – não tiveram a mínima possibilidade de fazer passar a sua mensagem, acabando por ficar muito distantes de qualquer veleidade de eleição de um representante no Parlamento. Destaque para os muito insatisfatórios resultados obtidos pelo MEP e… por Manuel Monteiro (PND), com uma campanha personalizada no distrito de Braga, sem efeitos práticos…

As sondagens, com bastante melhor desempenho que nas eleições europeias, não deixaram de registar alguns “tiros ao lado”: mesmo as sondagens “à boca da urna” revelaram uma sobreavaliação das estimativas de votação no PS e no Bloco de Esquerda (que acabariam por se aproximar dos limites mínimos dos intervalos), ao mesmo tempo que subestimavam a votação do PSD. Antes, tinham sobrestimado as percentagens do Bloco de Esquerda e do PSD, e, como acontece desde há alguns anos, pecado por defeito na projecção dos resultados do CDS.

Uma (quase) última palavra para a abstenção, que se aproxima dos 40 %. Perfeitamente natural, dado o desencanto e cansaço dos portugueses com a política, as campanhas eleitorais, e, por outro lado, pelo manifesto excesso de eleitores inscritos, que não poderá corresponder à efectiva realidade.

A vitória final é para a Democracia. Contrariando a tese da «asfixia democrática», os portugueses – como tem sido seu timbre – demonstraram uma vez mais saber fazer as escolhas mais adequadas no momento oportuno, sabendo distinguir com clara nitidez a natureza e responsabilidade de cada acto eleitoral. Descontentes com um estilo de governação, mas não se revendo nas alternativas disponíveis, transmitiram esse claro sinal: aos eleitos compete o difícil papel de criar as indispensáveis condições para a governabilidade do país.

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Resultados finais das Eleições legislativas Liga dos Campeões – 2ª Jornada

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