"Rio das Flores" (IV)

22 Novembro, 2007 at 8:43 am 1 comentário

Em busca de uma sempre difícil objectividade – não obstante acabar por tomar partido, de forma inequívoca, por uma das partes – o autor exponencia a dissensão política entre os irmãos, dando voz à perspectiva de Pedro, em diálogo de ruptura com Diogo:

«Tu gostas de Valmonte, mas não gostas da ideia de teres que defender a tua terra contra os teus inimigos. Gostas muito de brincar aos liberais e aos democratas, de ser muito compreensivo com os trabalhadores da herdade, mas, bem no fundo de ti, não gostas da ideia de que um dia eles não se contentem com isso e te queiram roubar a terra. Fazes muito gáudio em ser contra o Salazar e o Estado Novo, mas não gostarias de viver numa anarquia onde cada um não soubesse qual é o seu lugar e o teu não fosse o de uma vida confortável e despreocupada, com as mordomias correspondentes ao teu berço e à tua condição social e económica. Gostas muito do teu casamento e da tua família, mas desde que te dêem espaço para passares temporadas só para ti em Lisboa ou, melhor ainda, no Rio de Janeiro, a desempenhar o papel de que tu mais gostas: o de intelectual antifascista, culto e livre, moderno e cosmopolita, capaz de desembarcar de zeppelin e de ler jornais em quatro línguas. Mas o teu mundo só se aguenta, Diogo, porque há outros que pegam em armas e sujam as mãos e as consciências para defenderem o essencial dele. […] Eu, ao menos, lutei por aquilo em que acredito. Mas não te vi, nem do meu lado, nem ao menos do outro, Diogo! […] Podes crer que o teu papel foi bem mais fácil que o meu!».

Fatalmente atraído – como que por um qualquer estranho magnetismo – para o Brasil, onde as terras, com abundância de água, tinham um preço muito inferior ao praticado em Portugal, e os trabalhadores auferiam salários largas vezes inferiores, Diogo depara-se com o “lugar mais bonito que alguma vez vira à face da terra”, a Fazenda Águas Claras, junto ao Rio das Flores, nomes proféticos, correspondendo ao que, sem o saber de forma consciente, buscava. A 10 de Novembro de 1937, tornava-se dono de uma fazenda no Brasil…

Algum tempo depois, a pretexto da declaração de guerra – a 3 de Setembro de 1939 -, proclamada pela Inglaterra contra a Alemanha nazi, Diogo via-se retido no Brasil, sem poder viajar de forma segura para a Europa.

E assim se iria deixando ficar; ao mesmo tempo que criava e reforçava os laços à sua nova terra, mais se afastava de Portugal… e da família, com quem a troca de correspondência ia sendo cada vez mais espaçada.

Entry filed under: Livro do mês.

EURO 2008 – Finalistas "Letra de Forma" / "Mais cedo ou mais tarde"

1 Comentário Add your own

Deixe uma Resposta

Preencha os seus detalhes abaixo ou clique num ícone para iniciar sessão:

Logótipo da WordPress.com

Está a comentar usando a sua conta WordPress.com Terminar Sessão /  Alterar )

Imagem do Twitter

Está a comentar usando a sua conta Twitter Terminar Sessão /  Alterar )

Facebook photo

Está a comentar usando a sua conta Facebook Terminar Sessão /  Alterar )

Connecting to %s

Trackback this post  |  Subscribe to the comments via RSS Feed


Autor – Contacto

Destaques

Benfica - Quadro global de resultados - Printscreen Tableau
Literatura de Viagens e os Descobrimentos Tomar - História e Actualidade União de Tomar - Recolha de dados históricos

Calendário

Novembro 2007
S T Q Q S S D
 1234
567891011
12131415161718
19202122232425
2627282930  

Arquivos

Pulsar dos Diários Virtuais

O Pulsar dos Diários Virtuais em Portugal

O que é a memória?

Memória - TagCloud

Jogos Olímpicos

Twitter

Categorias

Notas importantes

1. Este “blogue" tem por objectivo prioritário a divulgação do que de melhor vai acontecendo em Portugal e no mundo, compreendendo nomeadamente a apresentação de algumas imagens, textos, compilações / resumos com origem ou preparados com base em diversas fontes, em particular páginas na Internet e motores de busca, publicações literárias ou de órgãos de comunicação social, que nem sempre será viável citar ou referenciar.

Convicto da compreensão da inexistência de intenção de prejudicar terceiros, não obstante, agradeço antecipadamente a qualquer entidade que se sinta lesada pela apresentação de algum conteúdo o favor de me contactar via e-mail (ver no topo desta coluna), na sequência do que procederei à sua imediata remoção.

2. Os comentários expressos neste "blogue" vinculam exclusivamente os seus autores, não reflectindo necessariamente a opinião nem a concordância face aos mesmos do autor deste "blogue", pelo que publicamente aqui declino qualquer responsabilidade sobre o respectivo conteúdo.

Reservo-me também o direito de eliminar comentários que possa considerar difamatórios, ofensivos, caluniosos ou prejudiciais a terceiros; textos de carácter promocional poderão ser também excluídos.


%d bloggers gostam disto: