Archive for 24 Janeiro, 2011
Eleições Presidenciais 2011
Já quase tudo foi dito e escrito sobre as eleições presidenciais de ontem, pelo que, «para memória futura», aqui deixo apenas algumas breves notas adicionais:
- Lamentável a confusão originada com o novo cartão do cidadão, sem indicação do número de eleitor, dificultando e impossibilitando mesmo, em alguns casos, o exercício do dever cívico dos cidadãos eleitores. Suponhamos que Cavaco Silva tivesse registado 49,9 % dos votos e que Manuel Alegre e Fernando Nobre tivessem ficado separados por margem mais escassa, e imaginemos o impacto que esta situação poderia ter tido no desfecho final da votação.
- Contundente a derrota averbada por Manuel Alegre, que não terá tido a capacidade de compreender e interpretar da forma mais apropriada as motivações para o resultado obtido em 2006. Apoiado por uma aliança contra-natura entre Bloco de Esquerda e Partido Socialista, viu cerca de 300 000 votantes escaparem-lhe e – tal como acontecera a Mário Soares – acaba por encerrar a sua carreira sem brilho.
- O mesmíssimo erro que Fernando Nobre poderá estar a ser induzido a cometer, ao sobrevalorizar e apropriar-se dos quase 600 000 votos que ontem obteve, que, como já bem ficou demonstrado, traduzem uma intenção expressa num determinando momento, num contexto e circunstância particulares, de difícil repetição, e que, tendencialmente, se esgota nesse acto.
- A par da votação em Fernando Nobre, sintomática a expressão do voto de protesto face ao sistema político na sua generalidade, quer por via dos votos brancos e nulos (mais de 6 %!), quer no candidato José Manuel Coelho (4,5 %) – somando um total de cerca de 25 % dos votos direccionados para opções excluindo os candidatos mais conotados com o sistema partidário. Começa a notar-se uma certa reincidência de casos em que os portugueses são levados a considerar que as eleições não são “a sério” – no sentido em que, ou têm um resultado esperado pré-determinado, ou são apercebidas como não tendo importância para o seu dia a dia, como ocorreu, por exemplo, nas eleições para o Parlamento Europeu – e em que, consequentemente, se sentem libertos ou até, de alguma forma, desresponsabilizados, o que lhes permite canalizar as suas opções para este tipo de voto. Porventura nunca, em 35 anos de Democracia, os portugueses terão tido, como tiveram ontem, tanta dificuldade em fazer uma escolha convicta por um dos candidatos.
- Como os eleitores “têm sempre razão”, mesmo quando optam por não votar (e, em particular, quando “votam em branco”, uma singular expressão de vontade), este tipo de comportamento, a par do preocupante nível de abstenção – traduzindo um verdadeiro “cartão amarelo” ao sistema político – requer uma reflexão aprofundada sobre as práticas políticas, o tipo de campanha eleitoral que se vai, cada vez mais, fazendo, e sobre quais são efectivamente as reais preocupações dos portugueses.
- Tal como em 2006, não é indicado procurar minimizar a legitimidade política da vitória de Cavaco Silva; a margem obtida face aos restantes candidatos “fala por si”, sendo cabalmente esclarecedora. Tal como não foi certamente a via mais indicada a adoptada pelo Presidente recandidato e reeleito no teor do seu discurso de vitória, repreendendo os abstencionistas e acusando os adversários de terem baseado a campanha em ataques pessoais. Em contraponto ao digno discurso de derrotado de Manuel Alegre e ao lúcido discurso de Pedro Passos Coelho, desligando o resultado da eleição presidencial de outras ilações de índole partidária.