Posts filed under ‘Economia e Gestão’
(Não digam a ninguém, mas…
…este Orçamento vai correr mal. Ninguém acredita nele, nem quem o faz. Mas shiu, parece que isso não pode ser dito alto, piscamos os olhos uns aos outros mas não dizemos nada. Hoje há OE, hoje temos a angústia do guarda-redes no momento do penálti, hoje vamos discutir o indiscutível mas só uma coisa não tem alternativa: insistir em vez de desistir. Insistir na mudança. Não seremos nós, será o tempo a rasgar o OE. […]
Pronto, não digam nada, guardem silêncio, há uma encenação para cumprir, por causa das opiniões públicas dos países do Norte, por causa dos gajos dos mercados. Guardemos os falhanços para nós e, aqui que ninguém nos ouve, fechemos os parêntesis e escrevamos uma única frase, audível e responsabilizadora).
Os portugueses têm de pagar austeridade. O Governo tem o dever de garantir a sua racionalidade, equidade e propósito. A UE e o FMI têm de mudar de plano – eles não são só credores, são responsáveis. E nós não podemos deixar que eles se esqueçam disso. Fazê-los merecer o próximo Nobel da Paz.
Plano B que devia ter sido Plano A
A vedeta dos tempos de hoje: o Plano B. Nada mau para um povo acusado de só ter olhos para o passado. Mudámos, agora é: ai, o que vai ser a seguir… Aquele “ai” é que está a mais mas não se pode ter tudo. O futuro, pois. Pacheco Pereira, o pessimista lúcido, já disse, esta semana, na Quadratura do Círculo, que não gosta dos termos “Governo de Salvação Nacional”, nem de “Governo de Iniciativa Presidencial”, mas que lá vai ter de ser, vai. Como diria uma das suas expressões favoritas, “está escrito nas estrelas”. Por acaso também está escrito numa crónica minha, aqui, no dia seguinte às últimas legislativas. Ao governo que devia ser chamei, simplesmente, “Governo”. O programa era o assinado com a troika e a composição era o que tinha de ser: sob a liderança do PSD, o partido mais votado, a aliança com o PS e o CDS. Os três juntos permitiam convencer melhor os portugueses sobre os sacrifícios. E os três juntos permitiam que esses sacrifícios não fossem canalizados para experiências particulares (na altura eu não sabia mas hoje pode explicar-se melhor do que devíamos fugir: chamemos-lhe maluquices do Gaspar). O Plano B apresentei-o como Plano A. Mau analista político que eu sabia ser, refugiei-me no bom senso e escrevi a crónica a 6 de junho de 2011. Errei foi na última frase: “Pensem nisso, antes que os factos obriguem a pensá-lo daqui a seis meses.” Fui tolamente otimista. Precisámos de um ano e quatro meses.
A “viragem” de orientação no FMI
FMI ensaia mudança de pele em 4 actos
É cedo para concluir se a teoria dos “austeristas” foi derrotada pela “revelação” espetacular feita por Olivier Blanchard no “World Economic Outlook” – um dos mais importantes documentos anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) – sobre o erro do multiplicador orçamental. […]
Acto I – FMI reconhece o erro no cálculo do “multiplicador” da austeridade
Acto II – Investigadores do FMI recomendam terapia diferente da troika
Acto III – World Economic Outlook de outubro de 2012 diz que depressão mundial depende de Bruxelas, Berlim e Washington
Acto IV — “É preciso deitar a crise para trás das costas”, diz Christine Lagarde
(artigo de Jorge Nascimento Rodrigues, de leitura obrigatória).
«A governação de cabotagem»
De novo, insisto, o espectáculo desta governação é penoso de se ver. […]
O resultado é a mais absurda governação à vista que é possível imaginar. […]
Nota actual: o que se está a passar com o Orçamento de Estado nunca foi visto em democracia: um Orçamento feito na rua e nos jornais, com fugas, umas deliberadas, outras não, com “balões de ensaio” para ver no que dá, com anúncios absurdos e irresponsáveis de violentos, seguidos de pequenas moderações para enganar, com alvos genéricos e, quando a coisa corre mal, mais pancada na função pública. Se é deliberado, tipo pau seguido de cenoura para esconder o pau que fica, coloca o governo ao nível de um mau assessor de comunicação, a fazer truques de marketing. Para isso há melhores profissionais fora de Portugal que podem ser contratados.
Só este triste espectáculo devia levar o Presidente a pôr alguma ordem nesta trapalhada ambulante, ridícula e perigosa ao mesmo tempo.
Fim do Euro ou maior integração?
Há coisas que parecem tão evidentes, que custa a crer como é possível tanta cegueira… Luciano Amaral (em debate na SIC Notícias) acaba de definir, numa frase singela, as alternativas para a saída da actual crise europeia:
- Ou acaba o euro (no seu modelo actual);
- Ou terá de haver maior integração (particularmente em termos orçamentais e políticos) a nível da União Europeia.
Custa assim tanto a perceber?
«Tributar o pai, a mãe, o avô, a avó, o gato e o periquito»
O risco de tudo isto está mais do que diagnosticado: o aumento da economia paralela; e a espiral recessiva, em que se aumenta cada vez mais os impostos para uma receita cada vez menor numa economia progressivamente recessiva e repleta de desempregados. Até porque, se o Governo mantiver a sua previsão de quebra do PIB em 1% para o próximo ano, estará provavelmente a ser optimista.
É assim que, em Lisboa, se trabalha no problema financeiro e se dissimula o problema político. Mesmo sabendo que a solução está fora daqui. Está em Berlim, em Bruxelas, em Frankfurt, em Washington, está até em Tóquio, onde decorre a reunião anual do FMI. Sim, FMI, o tal que diz que se enganou, afinal a sua prescrição falha… E vai fazer o quê? Brincar com o periquito?
«Gente talentosa»
1. Os explicadores profissionais das tolices que o governo faz já esclareceram que a opção de aumentar a taxação directa em lugar da indirecta no próximo ano pretende evitar a quebra das receitas agora verificada, dado que as pessoas podem contrair o consumo mas não reduzem o seu rendimento. Assim sendo, a execução orçamental estará mais controlada para o ano e o objectivo de redução do défice será confortavelmente cumprido.
Custa-me a crer que alguém acredite nesta fábula. O cataclismo em preparação estrangulará o mercado interno, arruinará muitas empresas e multiplicará o desemprego. Muitas pessoas ficarão sem meios de subsistência, logo deixarão de pagar impostos sobre o rendimento.
O resultado será, pois, similar àquele que experimentámos em 2012: miséria crescente para nada, pois que, no final, quer o défice quer o endividamento acabarão por aumentar.
Responsabilidade e Seriedade
FMI pede travão à austeridade na Europa
A directora-geral do FMI, a francesa Christine Lagarde, pediu aos Estados que ponham uma travão às medidas de austeridade, dando sinais de que a sua instituição está ficar cada vez mais preocupada com o impacto dos cortes governamentais sobre o crescimento.
Lagarde advertiu contra a prioridade aos cortes na despesa e aumentos de impostos: “Por vezes é melhor ter um pouco mais de tempo”, disse durante as reuniões anuais do FMI e do Banco Mundial, em Tóquio, citada no Financial Times de hoje.
(Público)
Durão Barroso isenta troika de responsabilidade pela austeridade
O presidente da Comissão Europeia disse hoje, em Bruxelas, ser fundamental que se perceba que os Governos nacionais são responsáveis pelas medidas de austeridade que aplicam, e não a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu ou o Fundo Monetário Internacional.
José Manuel Durão Barroso, que intervinha numa conferência sobre o “Estado da Europa” consagrada ao tema da política de austeridade, sublinhou que “as decisões não são tomadas pelas instituições europeias, mas sim pelos governos da Europa, e isso é muito importante em termos de responsabilidade, porque esta é parte do problema”, já que alguns governos tentam passar a ideia de que as medidas que adoptam lhes são impostas, “o que não é verdade”.
(Público)
Que outra interpretação podem ter estas palavras de dois dos mais altos responsáveis de entidades integrantes da Troika senão uma lamentável fuga às responsabilidades e falta de seriedade? A culpa morre sempre solteira…
P. S. Por cruel ironia, estas declarações são veiculadas no mesmo dia em que é anunciado o verdadeiro impacto do “enorme [brutal!] aumento de impostos”, com a publicitação dos novos escalões de IRS previstos para o próximo ano:

(via “Dinheiro Vivo“)
(Às taxas indicadas acresce a sobretaxa de 4%, em todos os escalões; no escalão mais alto – agora a partir de um rendimento de 80 000 €, acresce ainda a taxa de solidariedade, de 2,5%, elevando a taxa global até uns absurdos 54,5%!)
«Passa a palavra»
Como se faz a convocatória de um povo mantendo-o desinformado quanto à vida do seu País e de cada uma das vidas que o habitam? Vítor Gaspar fez anúncios negros repletos de espaços em branco. É preciso preencher esses espaços em branco, há dados fundamentais desconhecidos. Quais são os novos escalões de IRS? Quem vai pagar mais e quanto mais? O que é preciso poupar hoje para compensar mais tarde? Acima de que valor um trabalhador da iniciativa privada perde mais do que um salário em 2013? Qual é o máximo que um funcionário público pode perder? E o mínimo que um pensionista pagará? Quanto se vai pagar de IMI? Que valor de salário vai sobejar depois do fim das deduções fiscais? Em Maio de 2014, quando chegar o acerto do IRS, que surpresas haverá? Como podemos acreditar que há equidade sem dados para percebê-lo? Quanto vão pagar as concessionárias de PPP, se é que vão? Qual é a taxa sobre transacções financeiras? Que “grandes lucros” de empresas vão ser tributados? Qual a dimensão da economia paralela? Como será cortada despesa do Estado em quatro mil milhões de euros, como a troika obriga? Vão despedir militares, polícias? Vão cortar prestações sociais, subsídio de desemprego? Quanto? A quem? Não é uma falácia dizer que os portugueses vão ficar melhor em 2013 do que ficariam com a TSU, quando muitos vão ficar pior que em 2012? Como havemos de acreditar que a economia “só” decresce 1% no próximo ano? O que nos garante que não entramos em espiral recessiva? Por que razão a receita fiscal não quebrará no próximo ano se quebrou neste? Quando acaba afinal esta crise? Em 2014? Em 2018? Em dois mil e nunca? Que ambição podemos ter? Que gerações têm esperança? Que legado deixaremos? Sem respostas, os portugueses não sabem sequer quanto dinheiro vão ter daqui a três meses, quanto mais se acreditam no País.
Faltam cortes de despesa. Não há medidas de incentivo ao crescimento. O aumento do IRS é enorme. A julgar pela incidência, é preciso ganhar cada vez menos dinheiro para ter um “rendimento alto” para o fisco. Estamos mais pobres, mas há cada vez mais ricos.
«O bom exemplo»
A grande vantagem da conferência de imprensa de Vitor Gaspar foi a sua linear clareza: o anunciado “enorme aumento de impostos” é devido ao facto de “o ajustamento estar a revelar-se mais custoso do que o estimado”. Por outras palavras, o dinheiro vai todo para os cofres do estado, para que este possa pagar as suas dívidas. Nem mais, nem menos do que isto, e sem o álibi do recuo da medida para baixar a TSU, como é do mais elementar bom senso e bom gosto em circunstâncias tão dramáticas. […]
Ou seja, o governo anuncia que a redução da dívida do estado está para além das suas forças, o que já começara a ser perceptível de há algum tempo para cá. Sem juízos de valor sobre a delicada situação em que se encontra o governo de Passos Coelho, parece evidente que o país está irrecuperavelmente falido, que o governo se confessa impossibilitado de reverter a situação e que, muito em breve, os nossos credores serão chamados para novas conversações.



